29.9.05

Elogio ao amor

Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue pode ser, por isso, incompreensível. A culpa é minha. O que for incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de clareza. Serei muito claro.
Eu próprio percebo pouco do que tenho para dizer. Mas tenho de dizê-lo. O que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.
Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios. Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem.
A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas.
Eu quero fazer o elogio do amor puro,
do amor cego,
do amor estúpido,
do amor doente,
do único amor verdadeiro que há,
estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço.
Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance,romanticidas.
Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo? O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental.
Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade.
Amor é amor.
É essa beleza.
É esse perigo.
O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar. O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição.
Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe.
Não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem. Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a vida inteira, o amor não. Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também.
Miguel Esteves Cardoso

27.9.05

Repetición y diferencia, Gilles Deleuze

p.41 Es muy fastidioso tener que ponerse primero la camisa, luego los calzones, por la noches meterse en la cama, por la mañana salir de ella, y echar siempre un pie delante de otro. No hay esperanza de que tales cosas cambien jamás. Es muy triste que millones de personas hayan actuado así, y que millones de ellas sigan haciéndole después de nosotras, y que por encima de nuestra voluntad estemos hechos de dos mitades que constituyen una misma cosa, de modo que todo se produce por partida doble. p.62 Nos repetimos porque reprimimos. Reprimimos porque repetimos, olvidamos porque repetimos. Reprimimos porque, ante todo no podemos vivir ciertas cosas o ciertas experiencias si no es sobre el modo de la repetición.

25.9.05

Acabo de chegar a casa, depois de 20 minutos de pedalada e muita cubata! Quase dois litros de sangria, uma cerveja e umas cubatas de nao sei o quê! É boa a sensaçao que me invade, quando o de transporte só tem duas rodas�e uns pedais que acciono, juntamente com o álcool que nem dei conta de ter engolido! Sao quase 4 da manha. O meu vizinho ressona como se a agitaçao da cidade tivesse parado, mas no bairro da Carmen a coisa promete!
Vou buscar a minha mista e venho ja!

21.9.05

sabes quando?

Um dia perguntei a um amigo se lhe incomodava o silêncio. Foi surpreendente… pois, a partir daquele preciso (ou precioso, ou desastroso?) instante, acho que ele formou a bela ideia de que os artistas, independentemente da sua aparência, são destacadamente passados. Parte-se do sobreposto, que quem faz uma pergunta como: ‘Incomoda-te o silêncio?’ o sabe explicar quando perante a sua presença. Não necessariamente explicar, mas compreender, ou aceitar… ou talvez nada disso. Pois por surpresa infeliz, não soube entender aquele seu silêncio, seguido de uma expressão facial perplexa com tal anomalia. Um pedido de socorro sobre o instante em que eu soltei tais palavras interrogativas e, que até aquele minuto de aura, enchiam o meu ego de estabilidade emocional. Ambos decidimos fazer, daquele instante, o tempo que se vive sem recordar. Ambos incapazes de assumir a dúvida, continuamos a...

¡No lo creas! No hay dos modos de experimentar el mundo, pues uno consiste en experimentar el mundo y otro en experimentar la experiencia del mundo.
¡No te dejes engañar!

19.9.05

O problema é a cerveja!

Todos somos conscientes que não andamos aqui porque alguém assim o quis. Ups!... Talvez seja uma afirmação perigosa quando bem educadinhos, vivemos em sociedade?!?! Uns dirão: «É o destino!» Eu, na verdade, vejo-o todos os dias no café da esquina, na rua onde morei um ano. A sua rotina já o matou, por isso aquele sorriso perpétuo no rosto. Aceno com o braço direito pela manhã, cumprimento-o pelas tardes quando regresso a casa depois de mais um dia de agitação e muita pedalada. Por vezes, trocamos algumas palavras… mais que aquelas típicas expressões de tempo e análises ao céu. Ele sorri eternamente, como algo que não vive, mas que sobrevive no reflexo do copo de cerveja que sustenta com a mão esquerda queimada pelo vento. Um golo mais, um cigarro que parece nunca se ter fumado e um «Até amanhã!», que sei que um dia não terá sucesso… São 9.17 e saiu de casa, com a bicicleta debaixo do braço. Revisto o saco de tiracolo e chego à conclusão que não tenho horas para chegar a casa… tenho tudo para mais uma viagem. Sei que a 10 metros cruzarei o olhar com aquele sujeito ao qual não conheço o nome, mas que saludo com o braço direito, uma saudação com a paz de espírito, que muitas vezes não acorda comigo! E hoje não estava o copo de cerveja…

amanhecí com chuva, acordei com sol!

Nuvem perdida s o b r e voando

Pisa…

à mary

Hoje decidi escrever neste abstracto mundo,
o pouco de abstracto que conheço de mim. Sinto essa necessidade! O prazer de desenhar em folhas brancas de papel,
estes signos que dizem que são letras,
e que juntos e bem ordenados, ouvi por aí chamar, de palavras! Eu prefiro navegar nos rabiscos que ficam para trás e convidar-te,
a ti,
que dizes interpretar tais desenhos, a viajar nas suas formas…
a interpretar o “a” que precede o “p” e a respirar fundo. Não te percas tal como eu, quando me invade esta vontade de falar
com alguém…
esse alguém que não conheço,
mas que tenho a certeza que nos daríamos lindamente! Por isso, te convido, alguém… Vem! Não te peço mais do que a falares comigo, também!
19.set.2005